O futebol
não é apenas um esporte. Por mais que essa premissa seja clássica e manjada na
boca dos amantes do esporte bretão, eu afirmo mais uma vez. Não é só um
esporte. As histórias que circundam o futebol passam do surreal ao apoteótico.
Coisas inacreditáveis acontecem dentro e fora do campo. E não é a toa que ocupa
o primeiro lugar entre os esportes mais populares do mundo.
Foto: Sport Club Internacional |
Eu tinha 13 anos quando iniciou
aquele mês de dezembro. Adolescente, no final da sétima série, já fã de Stones
e cheio de espinhas na cara. Quatro meses antes daquele dezembro, o que eu
nunca imaginei que iria acontecer aconteceu: Fomos campeões da América. Bom, um
rapaz como eu, nascido em 1993 que viu o auge do rival e o colorado se quer
disputando finais, chegar à Libertadores já era uma vitória, vence-la era uma
loucura. Aliás, a verdadeira maior vitória de uma criança colorada que viveu os
anos noventa, era permanecer colorada. Quem resistiu foi recompensado.
Mas esse esporte não foi feito
apenas para as crianças, ele é o motivo da alegria de pessoas de qualquer
idade, cor, religião e classe social. Mas ainda me surpreende ver como uma
camiseta vermelha é capaz de diminuir a dor que a vida propicia no dia-a-dia
das pessoas. Vi isso no dia 13 de dezembro de 2006. Naquela semana tudo que respirávamos
era mundial de clubes. Do dia 10 até o dia 17. Vivíamos a angustia de algo que
nunca tínhamos vivido. Qualquer coisa que fosse ligado ao Inter me emocionava,
desde o Louro José dizendo que não teríamos o ‘Mais Você’ naquela quarta, pois
estaríamos torcendo pelo Colorado no Japão, até o famoso Toshiro perguntando
pro seu pai ‘CORORADO?’. O entrar em campo contra o Al-Ahly foi um dos momentos
mais nervosos da minha vida. Estávamos entrando num mundial com o uniforme todo
branco. Nada de vermelho no uniforme. Aquilo assustava. O jogo em si foi
angustiante até o apito final. Ainda bem que tínhamos o Pato e o Luiz Adriano
para nos classificar para a final. Depois disso viria o todo poderoso
Barcelona, que fez as honras de socar 4x0 no América um dia depois da nossa
vitória contra os egípcios.
Nada disso importava. Estávamos na
final do mundial. Quando a semi terminou, saí pela rua para dar aquela
espairecida básica depois de um jogo angustiante. Fui até a minha escola, da
qual matei aula, para conversar com os colegas e cornetear um velho professor
gremista. Tudo normal, até no meio do caminho ser abordado por um senhor
catador de papelão. Ele estava suado e cansado. O sol das 11h em dezembro aqui
no Rio Grande do Sul não é para amadores. Então ele observou minha camiseta vermelha
e foi perguntar como tinha sido o jogo e prontamente respondi que havíamos
vencido por 2x1. Lembre-se que ele estava suado, catando papelão, sem camiseta,
com o sol das 11h sob a cabeça, mas isso não foi o suficiente para tirar o
brilho nos olhos marejados e o sorriso de dentes tortos da boca. Fechou o punho
e gesticulou vitorioso enquanto dizia ‘graças a Deus’. Esqueceu totalmente as
porradas que a vida lhe deu e vibrou pelo nosso acesso a final. O sorriso não
lhe saia do rosto por nenhum segundo e eu só conseguia engolir seco o nó que
minha garganta dava. Ainda me contou a história de como queria estar vestindo a
camiseta do Inter naquele momento, mas não dava, pois estava sujo e suado. Mas
quando chegasse em casa iria colocar a sua camiseta, que ganhou recentemente e
era novinha: ‘tenho lá uma bem nova, bonita, da Aplub’. Me agradeceu a
informação e disse que iríamos ganhar no domingo. Saiu empurrando o carrinho,
fazendo força, mas sem tirar o sorriso do rosto. Acreditei nas palavras dele.
Nós iriamos ganhar no domingo.
Foto: Sport Club Internacional |
Já se passaram nove anos desde
aqueles dias e ainda fico incrédulo com a alegria que eu via nele. O Inter,
naquele dezembro, deu o maior presente que poderíamos receber: A felicidade.
Veja às vezes a vida pode ser terrível, pode nos dar rasteiras e ponta pés, mas
lá no Menino Deus, 891, tem um clube do qual estaremos ao lado até o final da
nossa existência. Aquele senhor, catador de papelão, não era nada na vida. Não
tinha posses e não tinha muitos motivos para estar ali feliz. Mas dias depois,
quando o Índio afastou de qualquer maneira a bola da defesa colorada, o Adriano
deu uma torneada de cabeça, que passou também pelo Luiz Adriano até cair nos
pés do Iarley que rumou para o contra-ataque, deixou Puyol na saudade, tocou
para Adriano Gabirú que mandou no canto esquerdo do Valdez. Naquele momento
mágico, aquele senhor que nada tinha e nada era podia dizer, sem medo e sem
dúvidas: Eu sou campeão do mundo. E desde então ele o é.
Escrito por Felipe Lopes
~Naquele momento mágico, aquele senhor que nada tinha e nada era podia dizer, sem medo e sem dúvidas: Eu sou campeão do mundo. E desde então ele o é.~
ResponderExcluircaralho, mano. Que esplendor de texto. Parabéns.