Pra um moleque, ainda mais no Brasil, normalmente o
futebol é uma religião. Jogar bola na rua, arrancando tampão do dedo, golzinho
na praia, futebol nas aulas de educação física ou nas aulas vagas na escola,
pelada com os amigos no sítio, ou até mesmo aquele “Winning Eleven” onde você demora
uma hora pra arrumar o time antes de jogar. Futebol é sagrado.
Já se passaram 12 anos. Era uma manhã de domingo. Lembro-me de receber o convite todo feliz do meu
pai, um dos que inspiraram a minha paixão pelo time mais lindo do mundo. Como
todo convite pra ver o Vasco jogar era como tirar uma nota 10 na escola, fiquei
entusiasmado de poder ver mais um jogo do meu time, dentro do próprio estádio. Ainda mais do Maior do Mundo.
No primeiro jogo, dias antes, do sofá de casa, deu pra ver o time
sair na frente do Fluminense, um adversário que já deu problemas, mas que agora
era o novo freguês. Com a vitória de 2 X 1, com direito a gol olímpico do
Marcelinho Carioca ( que criou uma relação muito boa com o Vasco, mesmo com
pouco tempo de história no clube), o time ficava mais tranquilo para levar o
título que não vinha desde 1998, ano do centenário. Depois dos traumáticos vices contra o Flamengo,
e lembro bem de todos, era a chance de ser de novo o Rei do Rio.
O Carioca, mesmo que o Fred deseja que ele acabe, tem
algo diferente. Não sabe que cada vitória contra o rival é como se fosse um
título. Mesmo que não haja troféu, mas sempre há a chance da zoação do dia
seguinte, das capas de jornal com manchetes em forma de piada, de colocar a
camisa do time num dia de semana. Hoje, ainda somos muito amadores. Ainda não
conseguimos engolir o Maracanã ser privado (e eu nunca irei), ou não poder
fazer festa de luzes, bandeiras e som como antigamente. Hoje estão tentando nos
fazer engolir um futebol-teatro. Eu não troco aplausos por gritos, pulos e cantos de alegria. Não acho os mosaicos mais bonitos que os bumbos, bandeiras e sinalizadores (não daqueles dos corintianos).
Naquele 23 de Março de 2003, o meu time era horrível. Digno
de pena. Iria chorar com ele o restante do ano, mas naquele domingo, o Vasco
foi o melhor time que eu precisava ter. O verdadeiro Maracanã era a visão mais linda. Os três níveis do
público eram a Arquibancada, para as torcidas fazerem sua festa; as Cadeiras
Comuns, pra galera se misturar, e a Geral, aonde iam os mais festeiros, e que
mais corriam risco de tomar um copo de xixi na cabeça. Depois de um PanAmericano sem graça e uma Copa do Mundo vergonhosa, só restou a saudade do biscoito de polvilho,
da pipoca do pacote rosa, do mate gelado, do alto falante avisando SUDERJ
informa: Público presente: 77.590...
Como não conseguimos lugar na Arquibancada, tivemos que
acompanhar das cadeiras comuns, o Vasco sair na frente com Léo Lima e depois o Fluminense empatar com algum desconhecido. No intervalo, pausa para ir nos banheiros lotados e simples. Um biscoitinho, uma conversa com o torcedor do lado e desde o começo do segundo tempo, eu já
estava em pé na cadeira, já que ninguém na minha frente queria sentar mais. E
nessa bagunça, sem poder olhar direito, minutos depois, só pude ver a bola subindo, vindo pra
trás e depois o Souza mandando pro gol. É. Minha baixa estatura aos 13 anos de
idade não me deixaram ver o cruzamento de letra do Léo Lima. Mas pouco depois, feliz da vida, pude sair do Maracanã campeão do
Rio mais uma vez. E ver o cruzamento milhares de vezes na TV.
Nos próximos dois domingos, pode se fazer uma nova marca.
Renovar o estoque de piadas da carniça, do pó de arroz e da cachorrada. Tudo
bem que o nível do Campeonato Carioca já não é o mesmo do passado. Tudo bem que
o adversário não é o mesmo. Nem que o Maior do Mundo é o mesmo. Tudo bem que ganhar
o Carioca não quer dizer nada para o resto da temporada. Tudo bem que tudo bem.
Mas é uma boa oportunidade de acabar com uma escrita: ganhar do freguês
alvinegro de uma vez por todas em jogos decisivos. E outra. Me dar uma nova
tarde de domingo como aquela de doze anos atrás.
Felipe Saraiva
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